A criação de um novo negócio, muito mais que vontade e uma boa ideia, exige conhecimento, disciplina e planejamento. O caminho do empreendedor é tortuoso e repleto de incertezas, razão pela qual a organização prévia se mostra imprescindível para mitigar boa parte dos obstáculos que surgem ao longo da jornada.
Dados mostram que o empreendedorismo brasileiro está em ebulição, em que todos buscam ser o criador do próximo unicórnio. Não menos certo, as estatísticas também mostram que parte significante destes esforços e ideias inovadoras ficam pelo caminho pelos mais variados motivos, dentre os quais destaco, por ora, o conflito de sócios.
Além dos desafios comerciais e operacionais inerentes a concepção de um produto e sua respectiva colocação e validação no mercado, muitos se esquecem de pensar nas questões internas do novo negócio. Durante as etapas da constituição de uma empresa, é preciso mapear os riscos e criar estratégias para enfrentá-los, incluindo a regulação da relação entre os fundadores e alinhamento das expectativas quanto uns aos outros.
Independentemente se empresa tradicional ou startup, extremamente pertinente uma medida que pode e deve ser adotada pelos empreendedores, antes mesmo de abrir a empresa. Trata-se do acordo ou memorando de fundadores ou cofundadores.
Também conhecido como Founders Agreement, este instrumento contratual, diferentemente do acordo de acionistas ou contrato social, deve ser elaborado de forma antecedente pelos futuros sócios, objetivando estabelecer todas as regras e condições para inicialização e desenvolvimento do negócio que será ou vem sendo criado.
O documento tem por propósito estabelecer regras de governança e relação interna entre os futuros sócios, com a definição de direitos, obrigações, metas, tempo de dedicação, papel e entrega de cada um no presente e quando for estabelecida a empresa, dentre outras possibilidades.
São muitas as situações que podem ser consignadas neste acordo, mas é comum – e bastante recomendável – a previsão de questões como:
– Diretrizes e princípios caros aos sócios, que definirão a cultura da nova empresa;
– Plano inicial de ações;
– Fixação de papéis, contribuição e entregas de cada fundador, com indicação mínima de metas, funções e dedicação pessoal para inicialização da empresa ou seu MVP;
– Direitos e deveres inerentes à sociedade, tais como invenções ou propriedade intelectual da solução objeto da sociedade empresarial em criação;
– Regras quanto à composição do capital social e distribuição do equity, com possibilidade de subscrição de cotas/ações por vesting ou outro critério para divisão dinâmica da participação;
– Definição de lock-up (obrigação do fundador permanecer no negócio por determinado período);
– Critérios e condições para admissão de novos sócios ou investimento externo;
– Medidas protetivas, tais como tag along, drag along, não concorrência, confidencialidade, não aliciamento de colaboradores etc.;
– Quóruns qualificados para deliberações específicas;
– Hipóteses e condições de exclusão ou retirada de sócio, com definição do método de apuração do valuation;
– Meios de solução de conflitos.
Obviamente que a elaboração deste acordo não é a certeza de sucesso do negócio, mas, como diz o ditado popular, “o combinado não sai caro”. O alinhamento prévio dos fundadores é extremamente recomendado para a paz interna, equalização de expectativas entre os pares e desenvolvimento da sociedade.
Deixar questões tão sensíveis para um “segundo momento” pode redundar no fim prematuro do sonho do sucesso empresarial, por entrave societário e bancarrota financeira.
Como vemos muitas ideias interessantes se perderem ao longo do caminho por desentendimento entre os sócios, que no momento de euforia inicial do projeto relegam a ocorrência de desafios presumíveis, esta diligência é muito importante para assegurar a estabilidade, tranquilidade e foco efetivo no objeto social da empresa e consecução dos objetivos.